segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

qüinquagésima página

hoje Hari falou mais.
gritou mais.
explorou mais todos os cantos da casa.
muito mais velocidade, mais vigoroso ao buscar o peito para mamar.
muito mais forte que eu.
hoje Hari ficou em pé.
no banho de balde.
duas vezes.
braços para fora, alavanca nos cotovelos e arriba para riba.
tudo isso como se não fosse a primeira vez.
Hari, o menino a quem ninguém mais pode impedir de vir.

Hari, 9 meses de vida

domingo, 30 de janeiro de 2011

quadrigésima nona página

dia número seis:
saimos para comprar chapéu de palha.
nosso primeiro passeio pela cidade.
almoço feliz no restaurante de kilo.
a própria familia de chita direto do sertão do guacuri.
comemoração do fogão novo, da vida nova.
milkshake ao som de cartola.
(quem diria, em itupeva?)
passeio sem hora para voltar.
passeio de duas horas cravadinhas.
passeamos sem hora para voltar.

Hari, 9 meses de vida

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

horta                                                                          

quadrigésima oitava página

dia número cinco:
passeio no parque do guacuri.
brisa boa e silêncio para o pensamento.
reserva.
dia de limpeza.
varreção.
eu, dia de plantação.
o começo de nossa horta.
hortelã na água, vaso pet.
porque quem planta colhe.
colheita boa, pela frente.

Hari, 8 meses de vida

sábado, 22 de janeiro de 2011

quadrigésima sétima página

Hari hoje chupou seu dedão.
Charmoso.
E empinou-se todinho.
Eram lindos braços retesados.
Foi olhar sua avó de coração, Renata.

(re-nata é avó de sangue de minha filha não nata)

Do corpo de cobrinha acelerada a réptil curioso, mais uma nova: um novo dentinho apontando.
Ai que coisa.
O oitavo mês tem sido o mês do menino.
O ex-bebê está chegando.

Hari já dá tchauzinho.
Com o punho e o braço gracioso apontando para o céu, olha direto nos olhos da vítima.
Seu braço mira, gira relembrando o céu.

(olho-flecha)

Também bate palminha.
E dá beijinho.
Bicoca docinha que agrada o freguês.

(é só pedir)

Mas devo aqui dizer, e aproveitando o ensejo, porque antes tarde do que nunca, o sexto mês... tenho muito que contar.

(estou em falta com você)

Sim estou porque foi ali que muito do hoje começou.
Porque ali primeira metade importante de sua vida foi vivida.
E por isso, aí, resolvemos festejar: passamos a noite em um hotel do centro de São Paulo.

Data importante.
(chique. a cama era king size)

E foram então a cada dia muitas novidades.
(atenção aos detalhes de mãe: paciência, é prolixa a corujice)

Primeiro de novembro: sua primeira virada.
Décimo sétimo dia de novembro: descobrindo sua mãozinha, eu descobrindo seu dentinho, febre.
Querendo engatinhar.
Vigésimo segundo dia de novembro: segundo dentinho.
Sentando, aos poucos.
Olha-me e sorri.
E bravo, o coloquei no chão e bateu os bracinhos no peito.

(que graça)

Choro bravo e as perninhas lançadas ao chão.

(tudo bem por aí?)

Bom, então. As frutinhas.
Lá vai.
Corri tanto para chegar até ali, no lugar onde eu não seria mais tão imprescindível e..... ai que ciúmes da laranja lima, da banana amassadinha.

Confesso que resisti a introdução das papas salgadas.
Porque ali o passo era mais definitivo.
Eu sei q não devia ser assim, assim tão sufocante.
Eu tão exaurida, amamentação em livre demanda, capengante, um queijo suíço ofegante.
Torcicolo de mamadas que capotava sentada na cama, ansiosa já a espera da próxima mamada em poucos minutos, já poucos minutos a última terminada.
Um caco.
Mas, (mas...) a intensidade umbilical, a dupla inseparável, o, digamos, prolongamento dessa gestação extra-uterina, começava a se despedir de mim.

(puxa vida)

Então poder um pouco sair pelo mundo. Meu filho já não precisando mais tanto de mim.

(sei que sou caso de psicanálise, esse amor exagerado)

Mas sim o peso do pesar.
Meu filho, a partir dali, já não precisa mais tanto de mim.

(vontade de passear sem ter hora para voltar)

Eu me despedindo aos poucos dessa imensa barriga.
E os nós de nóis dois aos poucos cabendo separados.

Hari, 8 meses de vida

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

quadrigésima sexta página

eu sou uma árvore.

Hari, 8 meses de vida

quadrigésima quinta página

dias número três e quatro:
brisa boa.
a vida de varanda é boa.
pressa. quero que a casa fique logo pronta para mim.
mim sou eu e meu sonho.
itupeva é duas ruas.
cidade boa essa.
tem pizzaria.
moraremos perto de um parque.
nosso quarto está quase pronto.
aí depois vem o banheiro.
vamos nos mudar aos poucos.
tem também supermercado. bom. 24 horas.
a vida é boa na varanda.
nossa casa vai ser branca.
branco.
me sinto em casa em casa.
eu gosto muito de supermercados.
a gente nem varreu a casa ainda.
resolvi que agora para as coisas vou ter a pressa de um bebe.
logo compraremos um fogão.
(tomara quem sabe uma geladeira nova)
eu quero levar minha geladeira de infância.
eu quero ser uma pessoa melhor.
a casa tá quase pronta para a gente ali acampar.
eu tenho pressa.
vai ser muito bom ali habitar.
mim. meu sonho e eu.
filho, a casa tá quase pronta.

Hari, 8 meses de vida

sábado, 15 de janeiro de 2011

quadrigésima quarta página

dia número dois:
quem tem amigo nunca está sózinho.
(andré foi conosco pintar a casa)
aventura na cidade, chuva transbordante, almoço divertido.
(Hari em sua primeira papinha de restaurante)
começo da pintura e reboco.
a vida é boa na varanda.
(continua sendo)

Hari, 8 meses de vida

quadrigésima terceira página

dia número um:
começamos a pintar a casa.
(não começamos a pintar a casa)
dia de comprar material, limpeza e massa corrida.
fim do dia cheia de contentamento.
(a vida na varanda é boa de bonita)

Hari, 8 meses de vida

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

quadrigésima segunda página

Hari hoje comeu papel.
A santinha que estava colada na parede.
Santa Cecília.
É um verdadeiro religioso. Antropofagicamente.
Já tinha falado isso antes. De ele ser antropofágico.
E é.
É pela boca que encarna. É também meu guia.
Me guia na expedição pelo escuro.

(tateando no escuro)

Na minha caminhada rumo a mãe que todos os dias um pouco mais me torno, vou descobrindo os instrumentos de regulação que devo ou não lançar mão, os instrumentos de regulação.
Céu. Terra.

(a gente se esquece como se faz essas coisas)

Logo depois que pari Hari eu estava toda aberta.
Aberta.
Entendi tanta coisa. Tanta coisa que agora não cabe mais em mim.
Fechei. Estreitei.
Porque para parir a gente tem que se abrir.
E para ser mãe é bom estreitar.
Sim. Para ajudar o outro a encarnar.

Tenho encarnando junto com o Hari. Tenho. Levando umas peias. Boas.
E meditado sobre missão.
Não cabe na estreitice de ser mãe muita vaidade não. Não orna.
E é bom, que se possível, menos pretensão aja ali. Claro. Mais gratidão.
E coragem para a humildade.

Maternar é caminho de evolução.
(e madrastar vezes é crueldade)

...
Eu tenho uma linda enteada. Um dragão.
E digo que quero poder ter mais paciência, dadivosa, proporcional a sua grande rebeldia.
E a embalar como minha filha.
É isso que ela quer, não é?
Acho que é.
...

Agora é bom eu ficar por aqui então, meditando sobre esse dois.
Irmão sol. Irmã lua.
Sobre a falta e a abundância.
E sobre o que está nas minhas mãos.
O resto, o resto... é pura falação.

Hari, 8 meses de vida